Atos Administrativos
Tudo aquilo que fazemos nosso dia-a-dia chamamos de atos.
Alguns atos, em especial, produzem efeitos jurídicos, ou seja, interessam ao
estudo do Direito. São os atos jurídicos, sempre manifestações da vontade
humana. Uma espécie desses é o ato administrativo.
Assim, atos administrativos são aqueles advindos da vontade
da Administração Pública na sua função própria, com supremacia perante o
particular, sob as regras do regime jurídico administrativo, de forma
unilateral, já que os bilaterais são ditos contratos administrativos.
Os atos administrativos é toda manifestação unilateral de
vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim
imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar
direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria.
Ressalte-se que a produção de atos administrativos não é
exclusividade do Poder Executivo, ainda que seja sua principal função. Os
demais Poderes, como se sabe, também pratica esses atos, nas suas funções
secundárias, Para que fique patente a diferença, em suas atividades
primordiais, o Poder Judiciário produz atos judiciais (dizer o Direito ao caso
concreto) e o Legislativo, atos legislativos (produção de leis em sentido
genérico).
Atos administrativos são aqueles produzidos por qualquer
Poder, no exercício da função administrativa.
Não são dessa espécie os atos praticados pela Administração
Pública em igualdade de condições com o particular, ou seja, seguindo as regras
do Direito Civil ou Comercial, como a emissão de um cheque ou locação de um
imóvel. São ditos simplesmente atos privados praticados pela Administração
Pública.
Fatos e Atos da Administração
Os atos da Administração Pública são divido em:
·
Materiais: também chamados fatos
administrativos, são meras ações de implementação da função administrativa,
como manter a cidade limpa ou corta uma árvore. Não pretende produzir afeitos
jurídicos, ainda que isso posso ocorrer, como o dever de indenizar, em casos de
prejuízo causado ao particular. Então, enquanto o ato produz efeitos jurídicos,
o fato não tem essa finalidade. É apenas a atividade material, a execução
concreta das funções da Administração Pública. A construção de uma lombada
(fato) pode-se originar do deferimento de um pedido do particular (ato) ou em face do cumprimento de uma ordem de
serviço da Administração (ato). Aos fatos administrativos, por óbvio, não se
aplica a teoria geral dos atos administrativos aqui estudada, como elementos,
atributos etc.
·
Jurídicos: são os que, com já visto, produzem
efeitos jurídicos. Esses efeitos podem seguir as regras do Direito Público, e
assim se denominam atos administrativo, ou do Direito Privado.
Formação
Como já sabemos, o ato é uma manifestação de vontade. No
caso, manifestação da Administração Pública.
Para sua formação, necessitam de cinco elementos
fundamentais, visto a seguir. A falta de qualquer deles leva à nulidade do ato,
com regra.
Elementos
Requisitos ou elementos de validade são as parcelas que
compõem o esqueleto do ato, de presença quase sempre obrigatória, sob pena de
nulidade.
São os seguintes seus elementos:
1.
Competência;
2.
Finalidade;
3.
Forma;
4.
Motivo;
5.
Objeto.
Em qualquer ato, seja ele vinculado ou discricionário, os
três primeiros requisitos serão de observância obrigatória, ou seja, sempre
serão vinculados.
Na esfera civil, temos característica semelhante. O art. 104
do Código Civil de 2002 assim prevê; “ A validade do negócio jurídico requer:
I- agente capaz; II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III
– forma prescrita ou não defesa em lei”.
O ato que desprovido de qualquer um dos elementos será
invalido. Relembre também que competência, finalidade e forma são
obrigatoriamente observados em qualquer tipo de ato, seja discricionário, seja
vinculado.
Competência
É a capacidade, atribuída pela lei, do agente público para o
exercício de seu mister. Como comentado, é sempre vinculado. Então, qualquer
ato, mesmo o discricionário, só pode ser produzido pela pessoa competente. Essa
competência, repita-se, é prevista na lei, e atribuída o cargo.
Quando o agente atua fora dos limites da lei, diz-se que
cometeu excesso de poder, passível de punição. Importante que não se confunda
excesso com desvio de poder (ou de finalidade). Ambos são modalidades de abuso
de poder, mas o primeiro importa ofensa à regra de competência, o segundo, ao
elemento finalidade do ato administrativo.
Como citado acima, a competência tem correspondência com a
capacidade na esfera civil. Porém, não se confundem. A capacidade é um dado
físico; a competência, por sua vez, é um dado legal.
Assim, no âmbito administrativo, diz que não é competente
quem quer, mas sim quem pode, de acordo com a previsão legal, sendo nulo o ato
praticado por agente incompetente.
A competência também é obrigatória, intransferível,
irrenunciável, imodificável, imprescritível e improrrogável. Improrrogável
significa dizer que se é incompetente hoje, continuará sendo sempre, exceto por
previsão legal expressa em sentido contrário, é dizer, um fato futuro não vai
prorrogar, ampliar, a competência do agente. Imprescritível é aquela que
continua a existir, independentemente de seu não uso. Dizer que é irrenunciável
corresponde à impossibilidade de o agente competente “abrir mão” de praticá-la.
Intrasferível, ou inderrogável, é a impossibilidade de se transferir a
competência de um para outro, por interesse das partes.
No entanto, essas características não vedam a possibilidade
de delegação ou avocação, quando prevista em lei.
E é a Lei n° 9.784/99, sobre processo administrativo na
esfera da Administração Pública federal que cuidou do tema expressamente, já
antes tratado no Decreto n° 200/67.
Relembrando, delegar corresponde ao repasse de atribuições
administrativas de responsabilidade do superior para o subalterno, e avocar
representa o caminho contrário da delegação, é dizer, acontece a avocação quando
o superior atrai para si a tarefa de responsabilidade do subordinando, podendo
tal atividade ter sido delegada para este ou ser de sua competência originária.
E a citada Lei assim prevê, em seu art. 12:
“Art. 12. Um órgão administrativo e seu titular poderão, se
não houver impedimento legal, delegar parte da sua competência a outros órgãos
ou titulares, ainda que estes não lhe sejam hierarquicamente subordinados,
quando for conveniente, em razão de circunstâncias de índole técnica, social,
econômica, jurídica ou territorial.
Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo aplica-se à
delegação de competência dos órgãos colegiados aos respectivos presidentes.”
Por outro lado, também proíbe a delegação nos seguintes
casos (art. 13):
·
A edição de atos de caráter normativo;
·
A decisão de recurso administrativos;
·
As matérias de competência exclusiva do órgão ou
autoridade.
Em atenção ao princípio da publicidade, o ato de delegação e
sua revogação deverão ser publicados no meio oficial (art. 14, “caput”).
Ademais, o ato de delegação é revogável a qualquer tempo pela autoridade
delegante (art. 14, §2°).
Por fim, sobre a avocação, o art. 15 dessa mesma Lei
determina que “será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes
devidamente justificados, a avocação temporária de competência atribuída a
órgão hierarquicamente inferior”.
Finalidade
A única e exclusiva finalidade de todo ato administrativo é
sempre o interesse público, jamais podendo ser praticado com a finalidade de
atender a interesse privado, caso em que será nulo e eivado de vício de desvio
de finalidade. Por isso, é outro elemento sempre vinculado.
Em obediência ao princípio da impessoalidade, aliado à
moralidade, o agente público não pode atuar visando interesses pessoais, seus
ou de algum grupo de cidadãos, seja para beneficiá-los indevidamente, ou
prejudica-los à margem da lei.
Assim, construir uma estrada com a finalidade de facilitar o
acesso à fazendo de uma autoridade influente, ou desapropriar um bem de um
inimigo ou, ainda, remover servidor para outra localidade com o fim de puni-lo,
são exemplos de desvio de finalidade, que tornam o ato nulo, por ofensa a esse
elemento vinculado de todo ato administrativo, violando, inclusive, preceito
constitucional (art. 37, “caput”, CF/88).
Forma
A forma é o modo através do qual se exterioriza o ato
administrativo, é seu revestimento. É outro elemento sempre essencial à
validade do ato. Se não existe forma, não existe ato; se a forma não é
respeitada, o ato é nulo. A forma só não é vinculada quando a lei deixar ao
agente a escolha da mesma. Quando a lei a estabelece, deve ser obedecida
sempre, sob pena de, repita-se, nulidade.
Como regra geral, os atos são escritos, mas podem ser orais,
ou então através de placas e semáforos de trânsito, sinais mímicos, como usados
pelos policiais, etc.
O art. 22 da Lei n° 9.784/99, já citada, regulamentando o
processo administrativo federal, determina que “os atos do processo
administrativo não dependem de forma determina senão quando a lei expressamente
a exigir”.
Motivo
O motivo é a circunstância de fato ou de direito que
determina ou autoriza a prática do ato. Então, é a situação fática que
justifica a realização do ato. Situação de fato é o conjunto de circunstâncias
que motivam a realização do ato; questões de direito é a previsão legal que
leva à prática do ato.
Esse componente do ato nem sempre está previsto na lei.
Quando está nela descrito, é vinculante, ou seja, o ato depende da ocorrência
da situação prevista. Em outras ocasiões, a lei defere ao agente a avaliação da
oportunidade e conveniência da prática do ato que, nesse casso, será
discricionário.
É vinculante a concessão de licença para que o servidor
trate de sua própria saúde, quando doente. Mas é discricionária a concessão de
licença para tratar de assuntos particulares, pois somente será deferida a
critério da Administração (art. 91 e 102, VIII, b, Lei n° 8122/90).
O mérito administrativo é a análise da oportunidade e da
conveniência ao praticar o ato.
O motivo não se confunde com a motivação. Esta é a série de
motivos externados que justificam a realização de determinado ato. Assim, todo
o ato tem seu motivo, mas nem sempre há a motivação que é, repise-se a
exteriorização dos motivos.
Seguindo essa corrente, a Lei n° 9.784/99, sobre o processo
administrativo federal, assim regrou a motivação dos atos:
“Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com
indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I- negue, limitem ou
afetem direitos ou interesses; II- imponha ou agravem deveres, encargos ou
sanções; III-decidam processos administrativo de concurso ou seleção pública;
IV- dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório; V- decidam
recursos administrativos; VI- decorram de reexame de ofício. VII- deixem de
aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres,
laudo, propostas e relatórios oficiais; VIII – importem anulação, revogação,
suspensão ou convalidação de ato administrativo. § 1° A motivação deve ser
explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância
com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas,
que, neste caso, serão parte integrante do ato. §2° Na solução de vários
assuntos da mesma natureza, pode ser utilizado meio mecânico que reproduza os
fundamentos das decisões, desde que não prejudique direito ou garantia dos
interessados. §3° A motivação das decisões de órgãos colegiado e comissões ou
de decisões orais constará da respectiva ata ou de termo escrito.”
Ainda que a motivação nem sempre seja exigência legal,
deve-se, sempre que possível, expor os motivos da realização do ato, com vista
ao melhor controle dos atos administrativos, vez que, em face da teoria dos
motivos determinantes, o motivo declarado vincula a validade do ato: se o
motivo for nulo, o ato também o será.
OBJETO
Objeto é o conteúdo do ato. É através dele que a
Administração exerce seu poder, concede um benefício, aplica uma sanção,
declara sua vontade ou um direito ao administrador etc.
Juntamente com o motivo, pode não estar previsto
expressamente na legislação, cabendo ao agente competente a opção que seja mais
oportuna e conveniente ao interesse público, caracterizando, então o exercício
do Poder Discricionário.
Mérito do Ato Administrativo
Para alguns atos administrativos, como citado, parte de seus
elementos formadores não tem um caminho obrigatório indicado pela lei. Esses
são os atos discricionários, cujos objetos e motivos podem ser avaliados,
valorados, dentro dos limites legais, pela autoridade responsável por sua
prática.
De maneira diversa, nos atos vinculados, todos os elementos
são previstos expressamente na lei, não deixando margem de manobra ao agente.
Qualquer que seja o ato, vinculado ou discricionário, a competência,
finalidade e forma sempre são de observância obrigatória, distinguindo-se um do
outro apenas pelo motivo e objeto.
Relembre-se que tal discricionariedade, ao analisar a
valoração dos motivos e escolher o objeto, não é ilimitada. A lei sempre vai
estabelecer, de forma expressa ou não, alguns limites, dentro dos quais o
agente pode atuar livremente. Fora desses limites, mesmo nos atos
discricionários, seu ato estará eivado do vício de excesso de poder. Assim, diz
que não existe ato puramente discricionário.
Esse ponto onde surge a distinção entre esses dois tipos de
atos é o que denomina de mérito administrativo: verificação do motivo e do
objeto, em atenção à oportunidade e conveniência da prática do ato de uma ou
outra maneira.
No ato vinculado não existe verificação do mérito, pois a
lei já esgotou as regras para sua prática, não cabendo ao agente escolha ou
verificação da oportunidade e da conveniência da prática daquele ato.
O mérito administrativo equivale a soma da conveniência
juntamente da oportunidade.
Isto posto, conclui-se que os atos vinculados são analisados
do ponto de vista da legalidade; os discricionários, além da legalidade, também
são vistos do ponto de vista do mérito.
E exatamente por isso que o controle dos atos
administrativos pelo Judiciário é limitado.
Nos atos vinculados, como se afere a legalidade de todos os
requisitos do ato, compete ao Judiciário o controle integral.
Porém, no caso dos discricionário, a parcela relativa ao
mérito foge da alçada judicial. Restando apenas o controle dos três elementos
sempre vinculados.
Não há controle judicial do mérito administrativo,
justamente por conter uma parcela subjetiva de valoração da oportunidade e
conveniência da prática do ato.
Contudo, o que não cabe é a verificação de escolha da
autoridade administrativa dentro dos limites impostos pela lei, posto que ao
agente é que compete a verificação da melhor forma de atender ao interesse
público. Se a valoração dos motivos e escolha do objeto deram-se fora dos
limites legais, naturalmente que há uma ilegalidade que pode ser revista pelo
Judiciário, anulando o ato e determinando a produção de outro, dentro dos
limites estabelecidos.
Repise-se: ao Judiciário, regra geral, só cabe análise de
legalidade do ato. No caso do discricionário, esse controle pode dar-se sempre
no que respeita à competência, finalidade e forma. Quanto ao mérito, somente se
exorbitar do estabelecido em lei.
Algumas teorias foram desenvolvidas para ampliar o controle
judicial, mesmo nos atos discricionários, para que se torne efetivo o atendimento
ao interesse público.
Assim, se o agente usa do seu poder discricionário para
atingir fim diverso do interesse coletivo, como vimos, age como desvio de poder
ou de finalidade, passível de aferição judicial.
Outra forma baseia-se no princípio da razoabilidade, aliado
à proporcionalidade e à moralidade. A parcela subjetiva do ato não pode fugir a
esses comandos constitucionais. No entanto, a verificação pelo Judiciário deve
ser cuidadosa, pois a parcela subjetiva é justamente a que identifica o ato discricionário,
e sua existência, além de legalmente prevista, é fundamental para o atingimento
das necessidades públicas, posto que o agente que está próximo do problema, tem
melhores condições de avaliar o melhor caminho.
Contudo, em determinadas situações, a escolha fere o senso
comum. Qualquer cidadão perceberia que o ato foi injusto, errado, imoral,
contrário ao povo. Nesse ponto, poderia o Judiciário atuar também, justificando
sua ação na violação dos princípios supra citados. Se essa injustiça, imoralidade
etc, não está tão patente assim, o controle judicial é afastado.
Cite-se ainda a Teoria dos Motivos Determinantes, a seguir
analisada, que também autoriza a fiscalização dos atos quando o motivo é nulo
ou inexistente, ainda que faça parte do mérito administrativo.
Um último comentário é necessário, o Judiciário, quando no
exercício de sua atividade atípica (secundária de administrador de seus órgãos
e servidores), também pratica atos, inclusive discricionários. Nesse caso, ele
mesmo pode rever seus critérios de oportunidade e conveniência, como, por
exemplo, ao fixar horário de atendimento ao público, ou nomear servidores, ou,
ainda, adquirir materiais e equipamentos para o desempenho de suas funções.
Teoria dos Motivos Determinantes
Nos chamados atos discricionários, os requisitos relativos
aos motivos e ao objeto são valorados pelo responsável pela prática do ato. Os
demais requisitos (competência, finalidade e forma) são sempre vinculados.
Atenção:
·
Motivos são pressupostos de fato e de direito
que justificam o ato.
·
Motivação é a manifestação expressa, indicando
os motivos que levaram ao ato.
Para o efetivo exercício do controle, tanto popular quanto
judicial, dos atos praticados pela Administração Pública, fundamental que se
saibam os motivos que os embasam, sejam eles vinculados ou discricionários.
Seguindo essa corrente mais atual, como regra geral, todos
os atos devem ser motivados. As poucas exceções dizem respeito a alguns atos
discricionários.
Assim, naqueles em que a motivação não é obrigatória, quando
o motivo é expressamente declarado, vincula-se ao ato, de tal forma que a
validade desse ato dependerá da validade do motivo externado. Essa é a Teoria
dos Motivos Determinantes.
É o motivo que justifica a realização do ato. Ele sempre
existe, mas nem sempre é dito. Então, se não era obrigatório sua declaração, e
foi dito, então se agrega umbilicalmente ao ato.
Se o motivo for inexistente, o ato será também inexistente.
Se for nulo o motivo, o ato, igualmente, será nulo. Por outro lado, se o
motivo, nulo, não está formalmente declarado, o ato seguirá válido, a não ser
que contenha outro tipo de vício.
Não se confunda a vinculação do motivo expressado com a
prática de um ato vinculado.
Nos atos vinculados, a motivação é sempre obrigatória. Em
alguns discricionários, não.
Porém, neste em que a motivação não é obrigatória, uma vez
feita, não torna o ato vinculado: ele continua sendo um ato discricionário.
A discricionariedade está em praticar o ato de uma forma ou
outra, em face dos motivos possíveis. Uma vez feita a opção por um dos
caminhos, e declarado o motivo dessa escolha, o ato passa a ter sua existência
e validade diretamente ligada ao motivo, mas, repita-se, a natureza do ato
continua sendo discricionária.
Atributos
Atributos são as características, as qualidades dos atos
administrativos, que os distinguem dos demais atos jurídicos, pois submetidos
ao regime jurídico administrativo.
Essas características são prerrogativas concedidas à
Administração Pública para que atenda de maneira adequada às necessidades do
povo.
Várias são as correntes doutrinárias sobre tais atributos,
mas aqui vamos citar aqueles mais importantes. Assim, são os seguintes os
atributos dos atos administrativos:
1.
Presunção de legitimidade e veracidade;
2.
Imperatividade;
3.
Auto-executoriedade;
4.
Tipicidade.
Presunção de Legitimidade e Veracidade
Presumir é entender, imaginar, supor, admitir algo como
certo ou verdadeiro.
Diz-se que se presume legítimo determinado ato
administrativo baseado no princípio de legalidade. Se ao administrador só cabe
fazer o que a lei admite, e da forma com, nela previsto, então, se produziu
algum ato, presume-se que o fez respeitando a lei.
A presunção de veracidade refere-se aos fatos citados pela
Administração Pública.
No entanto, há duas formas de presunção:
·
“Juris et de jure”: de direito e por direito,
presunção absoluta, que não admite prova em contrário;
·
“Juris tantum”: diz de presunção relativa ou
condicional que, resultante do próprio direito, e, embora por ele estabelecida
com verdadeira, admite prova em contrário.
O tipo aqui estudo é juris
tantum. Ainda que haja essa presunção, e todos devem obediência ao ato
enquanto não declarado inválido, cumprindo-o, pode haver prova em contrário.
Então a presunção é relativa.
Citem-se alguns dos efeitos das presunções de legitimidade e
veracidade:
1.
Não é necessária prévia manifestação do
Judiciário validando o ato;
2.
Todos devem cumpri-lo, enquanto não anulado;
3.
Cabe prova em contrário, a ser produzida por
quem alega o vício, ou seja, há inversão do ônus da prova. Em geral, a prova
cabe à Administração Pública, mas, nesse caso, em face da presunção citada, a
prova caberá ao interessado;
4.
Não há manifestação judicial de ofício quanto à
validade do ato administrativo, mas somente como provocação do interessado;
5.
Em obediência ao princípio da autotutela,
pode/deve a Administração Pública rever seus próprios atos, de ofício.
A presunção atinge todos os atos, inclusive aqueles
praticados pela Administração com base no direito privado. Qualquer que seja o
ato, se praticado pela Administração Pública, será presumidamente legítimo e
verdadeiro.
Imperatividade
Os atos administrativos são imperativos, se impõem aos
destinatários independentemente de concordarem ou não com ele, criando-lhes
obrigações.
É também chamado esse atributo de Poder Extroverso, que
garante ao Poder Público a capacidade de produzir atos que geram consequências
perante terceiros, impondo-lhes obrigações.
O poder coercitivo do Estado é que faz com que esses atos
sejam cumpridos, ainda que ilegais, enquanto não reconhecido tal vício.
Esse não é um atributo comum a todos os atos, mas tão
somente aos que impõem obrigações aos administrados (como normativos,
punitivos, de polícia). Assim, não têm essa característica os atos que outorgam
direitos (como autorização, permissão, licença), tampouco aqueles meramente
administrativos (como certidão, parecer).
Auto-Executoriedade
Esse atributo garante que Administração Pública possa fazer
executar o ato, por si mesma e imediatamente, independente de ordem judicial.
Baseia-se na necessidade, sempre, de atender aos interesses
públicos, muitas vezes urgentes. Assim, a determinação de requisição de bens
por ocasião de calamidade pública é auto executável.
Afirmar que a execução independe de manifestação do
Judiciário não significa dizer que esse ato escapa ao controle judicial. Ele
sim poderá ser levado ao crivo desse Poder, mas somente “a posteriori”, depois
que já está sendo ou foi cumprido, se houver provocação da parte interessada.
Não é o caso, repise-se, de manifestação prévia para que seja atendido. As vias
mais comuns para a defesa dos direitos ameaçados são o mandado de segurança e o
“habeas corpus” (art. 5°, LXIX e LXVIII, CF/88).
Dois são os requisitos para que este atributo esteja
presente no ato administrativo:
1.
Previsão legal, como nos casos de Poder de
Polícia (interdição de estabelecimentos comerciais, apreensão de mercadorias
etc.);
2.
Urgência, a fim de preservar o interesse comum,
como demolição de um prédio que ameaça ruir.
A título de ilustração, acrescente-se que, na esfera do
Direito Privado, raras são as situações em que esse atributo está presente. Em
geral, para executar um direito seu, o particular deve buscar auxílio do
Judiciário. Com exemplos de exceções temos a legítima defesa e ação para evitar
o esbulho ou a turbação (arts. 188, I e 1.210, § 1°, CC/2002).
Tipicidade
O ato administrativo deve corresponder a tipos previamente
definidos pela lei para produzir os efeitos desejados. Assim, para cada caso,
há a previsão de uso de certo tipo de ato em espécie. A esse atributo
denomina-se tipicidade.
A lei deve sempre estabelecer os tipos de atos e suas
consequências, garantindo ao particular que a Administração Pública não fará
uso de atos inominados, impondo obrigações de forma não prevista na lei. Por
igual motivo, busca impedir a existência de atos totalmente discricionários,
pois eles sempre deverão obediência aos contornos estipulados em lei.
Classificação
Classificações de atos existem as mais variadas. Cada autor
focaliza de uma forma diferente o agrupamento de características que julgam
importantes.
Traremos aqui um conjunto que julgamos útil, reafirmando que
não há a intenção de esgotar o tema, tampouco de colacionar toda sorte de
classificação existentes.
Quanto ao Conteúdo
·
Concretos: são atos produzidos visando a um
único caso, específico, e nele se encerram, como a nomeação ou concessão de
férias a um servidor.
·
Abstratos: chamados também de normativos, são os
que atingem um número indefinido de pessoas, e que podem continuar sendo
aplicados inúmeras vezes, como os regulamentos. São adstritos aos comandos
legais e constitucionais.
Quanto à Formação de Vontade
·
Ato simples: nasce da manifestação de vontade de
apenas um órgão, seja ele unipessoal (formado só por uma pessoa) ou colegiado
(composto de várias pessoas). É simples o ato que altera o horário de
atendimento da repartição pública, emitido por uma única pessoa, bem assim a
decisão administrativa do Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda,
órgão colegiado, que expressa uma vontade única.
·
Ato complexo: para que seja formado, necessita
da manifestação de vontade de dois ou mais órgãos diferentes, de tal forma que
cada um desses órgãos não pode, de forma independente, produzir validamente tal
ato: enquanto todos os órgãos competentes não se manifestarem, o ato não estará
perfeito, não podendo criar direitos ou atribuir deveres. Nesse tipo de ato,
tem-se a união de várias vontades que se juntam para formar apenas.
·
Ato composto: é aquele que nasce da vontade de
apenas um órgão. Porém para que produza efeitos, depende da aprovação de outro
ato, que o homologa. Assim sendo, afirma-se que um é instrumental em relação ao
outro, pois há, aqui, dois atos, um principal e outro acessório.
Quanto aos Destinatários
·
Individuais: são aqueles que têm destinatários
certos, nominados, como no caso da nomeação de servidores, ou delegação de
atribuições a um subordinado. Pode ser para apenas uma pessoa (singular), como
na desapropriação, ou para várias (plural), como na nomeação de vários
servidores no mesmo ato. O importante é que se sabe exatamente a quem se dirige
o ato.
·
Gerais: os destinatários são muitos, inominados,
mas unidos por características em comum, que os faz destinatários do mesmo ato
abstrato. Para produzirem seus efeitos, já que externos, devem ser publicados.
É desse tipo o ato que fixa novo horário de atendimento ao público pela
repartição, que afeta a todos os usuários daquele órgão, bem assim os decretos
regulamentares, instruções normativas etc.
QUANTO AOS EFEITOS
·
Constitutivo: gera uma nova situação jurídica
aos destinatários. Pode ser outorgando um novo direito, como permissão de uso
de bem público, ou impondo uma obrigação, como cumprir um período de suspensão.
·
Declaratório: simplesmente afirma ou declara uma
situação já existente, seja de fato ou de direito. Não cria, transfere ou
extingue a situação existente, apenas a reconhece. Também é dito enunciativo. É
o caso da expedição de uma certidão de tempo de serviço.
·
Modificativo: altera a situação já existente,
sem que seja extinta, não retirando direitos ou obrigações. A alteração do
horário de atendimento da repartição é o exemplo desse tipo de ato.
·
Extintivo: pode também ser chamado
desconstitutivo, que é o ato que põe termo a um direito ou dever existentes.
Quanto à Abrangência dos Efeitos
·
Internos: destinados a produzir seus efeitos no
âmbito interno da Administração Pública, não atingindo terceiros, como as
circulares e pareceres.
·
Externo: tem como destinatárias pessoas além da
Administração Pública, e, portanto, necessitam de publicidade para que produzam
adequadamente seus efeitos. São exemplos a fixação do horário de atendimento e
a ocupação de bem privado pela Administração Pública.
Quanto ao Grau de Liberdade para Produzir
·
Vinculado: a lei estabelece todos os contornos
do ato, como deve ser feito, quando, por quem etc., não deixando ao agente
qualquer grau de liberdade. Cumpridos todos os requisitos legais, a
Administração Pública não pode deixar de conceder a aposentadoria a quem de
direito, ou a licença para construir.
·
Discricionário: a lei também estabelece uma
série de regras para a prática de um ato, mas deixa certo grau de liberdade à
autoridade, que poderá optar por um entre vários caminhos igualmente válidos.
Há uma avaliação subjetiva prévia à edição do ato, como os que permitem o uso
de bem público, como a instalação de uma banca de revista na calçada.
Quanto à Validade
·
Válido: é o que atende a todos os requisitos
legais: competência, finalidade, forma, motivo e objeto. Pode estar perfeito,
pronto para produzir seus efeitos ou estar pendente de evento futuro.
·
Nulo: é o que nasce com vício insanável, ou
seja, um defeito que não pode ser corrigido. Não produz qualquer efeito entre
as partes. No entanto, em face dos atributos dos atos administrativos, ele deve
ser observado até que haja decisão, seja administrativa, seja judicial,
declarando sua nulidade, que terá efeitos retroativo, “ex tunc”, entre as
partes. Por outro lado, deverão ser respeitados os direitos de terceiros de
boa-fé que tenha sido atingido pelo ato nulo.
·
Anulável: é o ato que contém defeitos, porém,
que podem ser sanados, convalidados. Ressalte-que, se mantido o defeito, o ato
será nulo; se corrigido, poderá ser “salvo” e passar a válido. Atente-se que
nem todos os defeitos são sanáveis, mas sim aqueles expressamente previsto em
lei e analisados no item seguinte.
·
Inexistente: é aquele que apenas aparenta ser um
ato administrativo, manifestações de vontade da Administração Pública. São
produzidos por alguém que se faz passar por agente público, sem sê-lo, ou que
contém um objeto juridicamente impossível.
Quanto à Exequibilidade.
·
Perfeito: é aquele que completou seu processo de
formação, estando apto a produzir seus efeitos. Perfeição não se confunde com
validade. Este é a adequação do ato à lei; a perfeição refere-se às etapas de
sua formação.
·
Imperfeito: não completou seu processo de
formação, portanto, não está apto a produzir seus efeitos, faltando, por
exemplo, a homologação, publicação, ou outro requisito apontado pela lei.
·
Pendente: para produzir seus efeitos, sujeita-se
a condição ou termo, mas já completou seu ciclo de formação, estando apenas
aguardando o implemento desse acessório, por isso não se confunde com o
imperfeito. Condição é evento futuro e incerto, como o casamento. Termo é
evento futuro e certo, como uma data específica.
·
Consumado: é o ato que já produziu todos os seus
efeitos, nada mais havendo para realizar.
Anulação, Revogação e Convalidação
Os atos administrativos valem até a data neles prevista ou,
como regra geral, até que outro ato os revogue ou anule. Desde o nascimento,
seja ele legítimo ou não, produz seus efeitos, em face da presunção de
legitimidade e veracidade. Duas são as maneiras de um ato ser desfeito:
revogação e anulação.
Anulação
Um ato é nulo quando afronta a lei, quando foi produzido com
alguma ilegalidade. Pode ser declarada pela própria Administração Pública, no
exercício de sua autotutela, ou pelo Judiciário.
Opera efeitos retroativo, “ex tunc”, como se nunca tivesse
existido, exceto em relação a terceiros de boa-fé. Entre as partes, não gera
direitos ou obrigações, não constitui situações jurídicas definitivas, nem
admite convalidação.
Revogação
Revogação é a forma de desfazer um ato válido, legítimo, mas
que não é mais conveniente, útil ou oportuno. Como é um ato perfeito, que não
mais interessa à Administração Pública, só por ela pode ser revogado, não
cabendo ao Judiciário fazê-lo, exceto no exercício de sua atividade secundária
administrativa, ou seja, só pode revogar seus próprios atos administrativos.
Assim, seus efeitos são proativos, “ex nunc”, sendo válidas
todas as situações atingidas antes da revogação. Se a revogação é total,
nomeia-se ab-rogação; se parcial, chama-se derrogação.
Então em face de um incremento temporário do atendimento à
população, uma repartição pode, via ato administrativo, ampliar o horário para
fazer face a essa demanda. Com o passar do tempo, voltando ao normal, revoga-se
o ato que instituiu o novo horário, retornando o atendimento à hora normal,
estando válidos todos os efeitos produzidos no período de exceção.
Sobre anulação e revogação, veja as seguintes Súmulas do STF
e o art. 53 da Lei n° 9.784/99:
“Súmula 346: A Administração pública pode declarar a nulidade
dos seus próprios atos.”
“Súmula 473: A Administração pode anular seus próprios atos,
quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam
direitos; ou revoga-los, por motivo de conveniência ou oportunidade,
respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a
apreciação judicial.”
Lei n° 9.784/99, “Art. 53. A Administração deve anular seus
próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por
motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.”
Mas não é todo ato que pode ser revogado pela Administração
Pública. Alguns, em face de suas características peculiares, não podem ser
modificados. Isso pode decorrer de tipo de ato praticado ou dos efeitos
gerados.
Assim, não podem ser revogados, entre outros, os atos
vinculados, os já consumados, os que geraram direitos adquiridos, etc.
Noutros casos, fixa um prazo para o exercício desse
poder/dever. A propósito, veja o que determina o art. 54 da Lei n° 9.784/99:
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos
administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai
em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada
má-fé.
§1° No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de
decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§2° Considera-se exercício do direito de anular qualquer
medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
Em determinados casos, a
revogação de um ato administrativo que afete a relação jurídica mantida entre o
Estado e um particular pode gerar o dever de indenização para o segundo, posto
que o ato revogado foi válido durante algum tempo, e alguém pode ter agido com
base nele e sofre alguns prejuízos com sua revogação. Ressalte-se que, em
princípio, não há esse direito de indenização.
CONVALIDAÇÃO
Convalidar é tornar válido, é efetuar correções no ato
administrativo, de forma que ele fique perfeito, atendendo a todas as
exigências legais. A doutrina tradicional não admitia essa possibilidade,
aduzindo que, ou o ato era produzido com os rigores da lei, e, portanto válido,
ou era inválido.
Os vícios, no âmbito do Direito Privado, há muito podem ser
sanados, sendo considerados os atos assim praticados como anuláveis. No
entanto, a mesma possibilidade não era aceita no âmbito administrativo.
No entanto, a doutrina mais atual, seguida da jurisprudência
e até da legislação (Art. 50. VIII e 55, da Lei n° 9.787/99), tem abrandado
esse rigor, com vistas a melhor atender ao interesse público, evitando que
sejam anulados atos com pequenos vícios, sanáveis sem prejuízo das partes.
Nesse rumo, os ditos defeitos sanáveis podem ser corrigidos,
validando o ato. Ressalte-se que, se tais falhas não forem supridas, o ato será
nulo.
Como regra geral, os atos eivados de algum defeito devem ser
anulados. A exceção é que haja convalidação, como positivado na Lei n°
9.784/99, sobre o processo administrativo federal.
Essa é a possibilidade de convalidação expressa, desde que
não acarrete lesão ao interesse público ou prejuízo a terceiros. A mesma lei prevê
uma outra espécie, tácita.
Assim, nos termos do seu art. 54, eventual ato
administrativo viciado, de que decorram efeitos favoráveis para os
destinatários, que não seja anulado no prazo decadencial de cinco anos,
contados da data em que foram praticados, estará convalidado tacitamente, não
podendo mais ser alterado, salvo comprovada má-fé.
De uma forma ou de outra, a convalidação será sempre
retroativa, “ex tunc”, lançando seus efeitos sempre à data da realização
inicial do ato.
A finalidade, o motivo e o objeto nunca podem ser convalidados,
por sua própria essência. Só existe uma finalidade de todo ato público, que é
atender ao interesse público. Se é praticado para atender interesse privado,
não se pode corrigir tamanha falha. Quanto ao motivo, ou este existe, e a ato
pode ser válido, ou não existe, e não pode ser sanado. E o objeto, conteúdo do
ato, também não pode ser corrigido com vistas a convalidar o ato, pois ai
teríamos um novo ato, sendo nulo o primeiro.
No entanto, ainda nos resta a competência e a forma.
A forma pode sim ser convalidada, desde que não seja
fundamental à validade do ato. Se a lei estabelecia uma forma determinada, não
há como convalidar-se.
Com relação à competência, é possível a convalidação dos
atos que não sejam exclusivos de uma autoridade, quando não pode haver
delegação ou avocação. Assim, desde que não se trate de matéria exclusiva, pode
o superior ratificar o ato praticado por subordinado incompetente.
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