PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
1.
REGRAS E
PRINCÍPIOS
Antes de tratarmos dos princípios
fundamentais da República Federativa do Brasil, é necessário que compreendamos
dois conceitos: o de regras e o de princípios.
De início, vale destacar que as normas se dividem em dois tipos: i) regras e; ii) princípios. Em
outras palavras, regras e princípios são espécie do gênero normas; se
estivermos tratando de regras e princípios (implícitos e explícitos) previstos
na Constituição, estaremos nos referindo a normas
constitucionais.
As
regras são mais concretas, servindo para definir condutas. Já os princípios são mais abstratos: não definem condutas, mas
sim diretrizes para que se alcance a máxima concretização da
norma.
As
regras não admitem o cumprimento ou descumprimento parcial, seguindo
a lógica do “tudo ou nada”. Ou são cumpridas totalmente, ou, então,
descumpridas. Portanto, quando
duas regras entram em conflito, cabe ao aplicador do direito determinar qual
delas foi suprimida pela outra.
Por
outro lado, os princípios podem ser cumpridos apenas parcialmente. No caso de colisão entre princípios, o conflito é apenas
aparente, ou seja, um não será excluído pelo outro. Assim, apesar de a
Constituição, por exemplo, garantir a livre manifestação do pensamento (art.
5º, IV, CF/88), esse direito não é absoluto. Ele encontra limites na proteção à
vida privada (art. 5º, X, CF/88), outro direito protegido constitucionalmente.
2.
Princípios
Fundamentais
Os princípios constitucionais, segundo Canotilho, podem ser de
duas espécies:
a) Princípios político-constitucionais:
representam decisões políticas
fundamentais, conformadoras de nossa Constituição. São os chamados princípios
fundamentais, que estudaremos a seguir, os quais preveem as características essenciais do Estado brasileiro.
Como exemplo de princípios político-constitucionais, citamos o princípio da separação de poderes, a
indissolubilidade do vínculo federativo,
o pluralismo político e a dignidade da pessoa humana.
b) Princípios jurídico-constitucionais:
são princípios gerais referentes à ordem
jurídica nacional, encontrando-se dispersos pelo texto constitucional. Em
regra, derivam dos princípios político constitucionais. Como exemplo de
princípios jurídico constitucionais, citamos os princípios do devido processo legal, do juiz natural e da legalidade.
Uma
vez entendidos esses conceitos, passaremos à análise dos princípios fundamentais
(político-constitucionais), responsáveis pela determinação das características
essenciais do Estado brasileiro.
Princípios
Fundamentais são os valores que orientaram o Poder Constituinte
Originário na
elaboração da Constituição, ou seja, são suas escolhas políticas fundamentais.
Segundo Canotilho, são os princípios constitucionais politicamente
conformadores do Estado, que explicitam as valorações políticas fundamentais do
legislador constituinte, revelando as concepções políticas triunfantes
numa Assembleia Constituinte, constituindo-se, assim, no cerne político de uma
Constituição política.
Na Constituição Federal de 1988, os princípios fundamentais estão
dispostos no Título I, o qual é composto por quatro artigos. Cada um desses
dispositivos apresenta um tipo de princípio fundamental. O art. 1º trata
dos fundamentos da República Federativa do Brasil (RFB); o art. 2º, do
princípio da separação de Poderes; o art. 3º, dos objetivos fundamentais; e o
art. 4º, dos princípios da RFB nas relações internacionais.
3.
FUNDAMENTOS DA
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
Os fundamentos da
República Federativa do Brasil estão previstos no art. 1º, da Constituição
Federal de 1988. São eles os pilares, a base do ordenamento jurídico brasileiro.
Art. 1º A
República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito
e tem como fundamentos:
I - a
soberania;
II - a
cidadania
III - a
dignidade da pessoa humana;
IV - os
valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o
pluralismo político.
Parágrafo
único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes
eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Para memorizá-los, usamos a famosa sigla “SOCIDIVAPLU”:
soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e
da livre iniciativa e pluralismo político.
A soberania é um atributo essencial ao Estado, garantindo
que sua vontade não se subordine a qualquer outro poder, seja no plano interno
ou no plano internacional. A soberania é considerada um poder supremo e
independente: supremo porque não está limitado a nenhum outro poder na
ordem interna; independente porque, no plano internacional, não se subordina à
vontade de outros Estados.
Assim, no âmbito interno, as normas e decisões elaboradas pelo
Estado prevalecem sobre as emanadas de grupos sociais intermediários como
família, escola e igreja, por exemplo. Por sua vez, na órbita internacional, o
Estado somente se submete a regras em relação às quais manifestar livremente o
seu consentimento.
A soberania guarda
correlação direta com o princípio da igualdade entre os Estados, que é um dos
princípios adotados pela República Federativa do Brasil em suas relações
internacionais (art. 4º, V, CF/88).
É relevante destacar que a soberania deve ser vista sob uma perspectiva
(sentido) democrática, donde surge a expressão “soberania popular”.
Com efeito, o art. 1º, parágrafo único, dispõe que “todo o poder emana do povo,
que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente” nos termos
da Constituição.
A cidadania, por
sua vez, é simultaneamente um objeto e um direito fundamental das pessoas; ela
representa um verdadeiro status do ser humano: o de ser cidadão e, com isso, ter assegurado o seu direito de
participação na vida política do Estado.
A previsão da cidadania como fundamento do Estado brasileiro exige
que o Poder Público incentive a participação popular nas decisões políticas do
Estado. Nesse sentido, está intimamente ligada ao conceito de democracia, pois
supõe que o cidadão se sinta responsável pela construção de seu Estado, pelo
bom funcionamento das instituições.
A dignidade da pessoa
humana é outro fundamento da República Federativa do Brasil e consiste
no valor-fonte do ordenamento
jurídico, a base de todos os direitos fundamentais. Trata-se de
princípio que coloca o ser humano
como a preocupação central para o Estado brasileiro: a proteção às
pessoas deve ser vista como um fim em si mesmo.
Segundo
o STF, a dignidade da pessoa humana é princípio supremo, “significativo vetor
interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o
ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo
expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem
republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional
positivo.”
O princípio da dignidade da pessoa humana possui elevada densidade
normativa e pode ser usado, por si só e independentemente de regulamentação,
como fundamento de decisão judicial. Além de possuir eficácia negativa
(invalidando qualquer norma com ele conflitante), o princípio da dignidade da
pessoa humana vincula o Poder Público, impelindo-o a adotar políticas para sua
total implementação.
Em razão da importância do princípio da dignidade da pessoa
humana, o STF já o utilizou como fundamento de diversas decisões importantes. A
seguir, comentaremos os principais entendimentos do STF acerca da dignidade humana:
a)
O STF considerou legítima a união homoafetiva como entidade
familiar, em razão do princípio da dignidade da pessoa humana e do direito à
busca pela felicidade. Segundo a Corte:
“a
extensão, às uniões homoafetivas, do mesmo regime jurídico aplicável à união
estável entre pessoas de gênero distinto justifica-se e legitima-se
pela direta incidência, dentre outros, dos princípios constitucionais da
igualdade, da liberdade, da dignidade, da segurança jurídica e do postulado
constitucional implícito que consagra o direito à busca da felicidade, os quais
configuram, numa estrita dimensão que privilegia o sentido de inclusão
decorrente da própria Constituição da República (art. 1º, III, e art. 3º, IV),
fundamentos autônomos e suficientes aptos a conferir suporte legitimador à
qualificação das conjugalidades entre pessoas do mesmo sexo como espécie do
gênero entidade familiar”. (E 477554 MG, DJe-164 DIVULG 25-08-2011 PUBLIC 26-08-2011 EMENT
VOL-02574-02 PP-
00287.)
00287.)
b) O STF considera que não ofende o direito à vida e a dignidade da pessoa humana a pesquisa com células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização “in vitro” e não utilizados neste procedimento.
Sobre esse
ponto, vale a pena esclarecer que, quando é realizada uma fertilização “in
vitro”, são produzidos vários embriões e apenas alguns deles são
implantados no útero da futura mãe.
Os embriões
não utilizados no procedimento (que seriam congelados ou descartados) é que
poderão ser objeto de pesquisa com células-tronco.
c) O STF entende
que não é possível, por violar o princípio da dignidade da pessoa
humana, a submissão compulsória do pai ao exame de DNA na ação de
investigação de paternidade.
Voltando à análise dos fundamentos da República Federativa do
Brasil, a elevação dos valores sociais do trabalho e da livre
iniciativa a essa condição reforça que o nosso Estado é capitalista, e,
simultaneamente, demonstra que o trabalho tem um valor social.
É o trabalho, afinal, ferramenta essencial para garantir, em
perspectiva menos ampla, a subsistência das pessoas e, em perspectiva mais
abrangente, o desenvolvimento e crescimento econômico do País.
Observe que o art. 170 da CF/88 reitera esse fundamento, ao
determinar que “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social”.
Por último, o Estado brasileiro também tem como fundamento o pluralismo
político. Esse princípio visa garantir a inclusão dos diferentes grupos
sociais no processo político nacional, outorgando aos cidadãos liberdade de
convicção filosófica e política. Como seu corolário, tem-se a liberdade de
criação e funcionamento dos partidos políticos.
O STF entende que a crítica jornalística é um direito cujo
suporte legitimador é o pluralismo político; o exercício desse direito deve,
assim, ser preservado contra ensaios autoritários de repressão penal.
Cabe destacar que o pluralismo político exclui os discursos de
ódio, assim considerada qualquer comunicação que tenha como objetivo inferiorizar
uma pessoa com base em raça, gênero, nacionalidade, religião ou orientação sexual.
No Brasil, considera-se que os discursos de ódio não estão amparados pela
liberdade de manifestação de pensamento.
I.
Forma de Estado /
Forma de Governo / Regime Político
Dentre as decisões políticas fundamentais, estão a definição da
forma de Estado e a forma de governo. Essas opções políticas foram escolhidas
pelo Poder Constituinte Originário logo no início do texto constitucional (art.
1º,caput):
a)
Forma de
estado diz respeito à maneira pela qual o poder está territorialmente repartido; em outras
palavras, é a repartição territorial do
Poder que irá definir a forma de Estado. Nesse sentido, um Estado poderá
ser unitário (quando o poder está territorialmente centralizado) ou federal
(quando o poder está territorialmente descentralizado).
O
Brasil é um Estado federal, ou seja, adota a federação como forma de Estado. Há diversos entes federativos (União,
Estados, Distrito Federal e Municípios), todos eles autônomos, dotados de governo próprio e de capacidade política.
São pessoas jurídicas de
direito público que mantêm entre si um vínculo indissolúvel. Em razão dessa indissolubilidade, um
estado ou município brasileiro não pode se separar do Brasil; diz-se que, em
uma federação não há o direito de secessão.
É esse o princípio da indissolubilidade do vínculo federativo, o
qual é reforçado pelo fato de que a federação é cláusula pétrea da CF/88 (art.
60§ 4º, I, CF), não podendo, portanto, ser objeto de emenda constitucional
tendente à sua abolição.
O Estado federal, segundo a doutrina, apresenta duas
características: autonomia e participação. A autonomia traduz-se na
possibilidade de os Estados e Municípios terem sua própria estrutura
governamental e competências, distintas daquelas da União. A participação, por
sua vez, consiste em dar aos Estados a possibilidade de interferir na formação
das leis.
Ela é garantida, em nosso ordenamento jurídico, pelo Senado, órgão
legislativo que representa os Estados. Cabe destacar que autonomia difere de
soberania. No Brasil, apenas a República Federativa do Brasil (RFB) é
considerada soberana, inclusive para fins de direito internacional; só ela
possui personalidade internacional. Isso porque, na Federação, os entes
reunidos, apesar de não perderem suas personalidades jurídicas, abrem mão de
algumas prerrogativas, em benefício do todo (Estado Federal).
Dessas, a principal é a soberania. A União é quem representa a RFB
no plano internacional (art. 21, inciso I), mas possui apenas autonomia, jamais
soberania. Destaque-se, todavia, que os outros entes federativos até podem
atuar no plano internacional, mas apenas na medida em que a RFB os autoriza.
Como exemplo, pode-se citar a contratação de empréstimo junto ao Banco Mundial
pelo Estado de São Paulo, para fins de construção de uma rodovia.
Na CF/88, os Municípios foram incluídos, pela primeira vez, como
entidades federativas. Com essa previsão constitucional, o federalismo
brasileiro passou a ser considerado um federalismo de terceiro grau: temos uma
federação composta por União, Estados e Municípios.
No Brasil, a União, os Estados-membros e os Municípios, todos
igualmente autônomos, têm o mesmo “status” hierárquico, recebendo tratamento
jurídico isonômico. O governo de qualquer um deles não pode determinar o que o governo
do outro pode ou não fazer. Cada um exerce suas competências dentro dos limites
reservados pela Constituição.
A federação brasileira tem como característica ser resultado de um
movimento centrífugo, ou seja, formou-se por segregação. Isso porque no Brasil,
até a Constituição de 1891, o Estado era unitário (centralizado), tendo, então,
se desmembrado para a formação dos estados-membros. Já nos Estados Unidos, por exemplo, os Estados se
agregaram, num movimento centrípeto, para formar o Estado federal.
Outra característica de nosso federalismo é que ele é cooperativo.
A repartição de competências entre os entes da federação se dá de forma que todos
eles contribuam para que o Estado alcance seus objetivos. Algumas competências
são comuns a todos, havendo, ainda, a colaboração técnica e financeira entre
eles para a prestação de alguns serviços públicos, bem como repartição das
receitas tributárias.
b) Forma de Governo é o modo como se dá a instituição do poder na sociedade e a
relação entre governantes e governados. Quanto à forma de governo, um Estado
poderá ser uma monarquia ou uma república.
No Brasil, a forma de governo adotada (art. 1º, caput), foi a
república.
São características da República o caráter eletivo, representativo
e transitório dos detentores do poder político e responsabilidade dos governantes.
Os governantes, na República, são eleitos pelo povo, o que vincula
essa forma de governo à democracia. Além disso, na República, o governo é
limitado e responsável, surgindo a ideia de responsabilidade da Administração
Pública.
Finalmente, o caráter transitório dos detentores do poder político
é inerente ao governo republicano, sendo ressaltado, por exemplo, no art. 60,
§4º da CF/88, que impede que seja objeto de deliberação a proposta de emenda constitucional
tendente a abolir o “voto direto, secreto, universal e periódico”.
Outra importante característica da República é que ela é fundada
na igualdade formal das pessoas. Nessa forma de governo é intolerável a discriminação,
sendo todos formalmente iguais, ou seja, iguais perante o Direito.
c) O regime político adotado pelo Brasil é a democracia, o que fica claro
quando o art. 1º, caput, da CF/88 dispõe que a República Federativa do Brasil
constitui-se um Estado democrático de direito.
O Estado de Direito é aquele no qual existe uma limitação dos poderes estatais; ele representa uma superação
do antigo modelo absolutista, no qual o governante tinha poderes ilimitados. O
surgimento do Estado de direito se deve aos movimentos constitucionalistas
modernos.
A evolução histórica do Estado de Direito nos evidencia que,
inicialmente, predominava a ideologia liberal; era o chamado Estado Liberal
de Direito, no qual a limitação do poder estatal e a garantia das
liberdades negativas eram os principais objetivos.
Posteriormente, com a Revolução Industrial e a Revolução Russa, o
Estado liberal dá lugar ao Estado Social de Direito, marcado pela
exigência de que o Estado oferte prestações positivas em favor dos indivíduos
(direitos sociais).
Hoje, vive-se o momento do Estado Constitucional, que é, ao
mesmo tempo, um Estado de Direito e um Estado democrático. Cabe destacar que a expressão
“Estado Democrático de Direito” não implica uma mera reunião dos
princípios do Estado de Direito e do Estado Democrático, uma vez que os supera,
trazendo em si um conceito novo, mais abrangente.
Trata-se, na verdade, da garantia de uma sociedade pluralista, em que todas as pessoas se
submetem às leis e ao Direito, que, por sua vez, são criados pelo povo, por
meio de seus representantes.
A lei e o Direito, nesse Estado, visam a garantir o respeito aos direitos fundamentais,
assegurando a todos uma igualdade material, ou seja, condições materiais
mínimas a uma existência digna.
Nos dizeres de Dirley da Cunha Jr, “o Estado Democrático de Direito,
portanto, é o Estado Constitucional submetido à Constituição e aos valores
humanos nela consagrados.”
O princípio democrático é reforçado pelo parágrafo único do
art.1º da Constituição Federal. Segundo esse dispositivo, todo o poder emana
do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”
nos termos da Constituição.”
No Brasil, existe uma democracia semidireta ou participativa,
assim caracterizada pelo fato de que o povo, além de participar das decisões
políticas por meio de seus representantes eleitos, também
possui instrumentos de participação direta.
São
formas de participação direta do povo na vida política do Brasil o plebiscito,
o referendo, a iniciativa popular de leis e ação popular. Esses mecanismos são
o que a doutrina chama “institutos da democracia semidireta”.
II.
Harmonia e
Independência entre os Poderes.
A separação de poderes é um princípio cujo objetivo é evitar
arbitrariedades e o desrespeito aos direitos fundamentais; ele se baseia na
premissa de que quando o poder político está concentrado nas mãos de uma só
pessoa, há uma tendência ao abuso do poder. Sob essa perspectiva, a separação
de poderes é verdadeira técnica de limitação do poder estatal.
As origens da separação de poderes remontam a Aristóteles, com a
obra “A Política”. Posteriormente, o tema também foi trabalhado por João Locke
e, finalmente, por Montesquieu, em sua célebre obra “O espírito das leis”.
Modernamente, a separação de poderes não é vista como algo rígido.
Com efeito, o poder político é uno, indivisível; assim, o que pode ser objeto
de separação são as funções estatais (e não o poder político). Assim, apesar de
a Constituição falar em três Poderes, na verdade ela está se referindo a
funções distintas de um mesmo Poder: a legislativa, a executiva e a judiciária.
A Constituição Federal de 1988 adotou, assim, uma separação de
Poderes flexível. Isso significa que eles não exercem exclusivamente suas
funções típicas, mas também outras, denominadas atípicas. Um exemplo disso é o exercício
da função administrativa (típica do Executivo) pelo Judiciário e pelo Legislativo,
quando dispõem sobre sua organização interna e sobre seus servidores,
nomeando-os ou exonerando-os. Ou, então, quando o Poder Executivo exerce função
legislativa (típica do Poder Legislativo), ao editar medidas provisórias ou
leis delegadas.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 2º, trata da separação
de poderes, dispondo que “são poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.” Chama-nos
a atenção o fato de que a Constituição explicita que os três Poderes são “independentes
e harmônicos”. Independência é a ausência de subordinação, de
hierarquia entre os Poderes; cada um deles é livre para se organizar e não pode
intervir indevidamente (fora dos limites constitucionais) na atuação do outro. Harmonia,
por sua vez, significa colaboração, cooperação; visa garantir que os Poderes
expressem uniformemente a vontade da União.
A independência entre os Poderes não é absoluta. Ela é limitada
pelo sistema de freios e contrapesos, de origem norte-americana. Esse
sistema prevê a interferência legítima de um Poder sobre o outro, nos
limites estabelecidos constitucionalmente. É o que acontece, por exemplo,
quando o Congresso Nacional (Poder Legislativo) fiscaliza os atos do Poder
Executivo (art. 49, X, CF/88). Ou, então, quando o Poder Judiciário controla a constitucionalidade
de leis elaboradas pelo Poder Legislativo.
III.
Objetivos
Fundamentais da República Federativa do Brasil
Os objetivos fundamentais são as finalidades que devem ser perseguida elo Estado brasileiro. Que tal analisarmos o art. 3º da Carta Magna?
Art. 3º Constituem
objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir
uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o
desenvolvimento nacional;
III - erradicar a
pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o
bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
Para ajudá-lo na memorização do mesmo, peço que preste atenção nos
verbos, sempre no infinitivo: construir, garantir, erradicar e promover.
A promoção do bem de todos, sem preconceitos, alçada pela Carta
Magna à condição de objetivo fundamental da República Federativa do Brasil,
consagra a igualdade material como um dos objetivos da República Federativa do Brasil.
O Estado não pode se contentar com a atribuição de igualdade perante a lei aos
indivíduos; ao invés disso, deve buscar reduzir as disparidades econômicas e
sociais.
Um
exemplo da aplicação desse princípio é a reserva de vagas nas Universidades
Federais, a serem ocupadas exclusivamente por alunos egressos de escolas
públicas (cotas raciais). Busca-se tornar o sistema educacional mais justo, mais igual. Não
se trata de preconceito, mas de uma ação afirmativa do Estado.
Elucidando esse conceito, o STJ dispôs o seguinte:
“ações
afirmativas são medidas especiais tomadas com o objetivo de assegurar progresso
adequado de certos grupos raciais, sociais ou étnicos ou indivíduos que
necessitem de proteção, e que possam ser necessárias e úteis para proporcionar a
tais grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e
liberdades fundamentais, contanto que, tais medidas não conduzam, em
consequência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos
raciais, e não prossigam após terem sido alcançados os seus objetivos” (REsp 1132476/PR,
Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª Turma, julgado em 13/10/2009, DJe
21/10/2009)
I.
Princípios das Relações Internacionais:
Estudaremos, agora, os princípios que regem a República Federativa
do Brasil em suas relações internacionais, os quais estão relacionados no art.
4º, da Constituição Federal.
Art. 4º A
República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações
internacionais
pelos seguintes princípios:
I -
independência nacional;
II -
prevalência dos direitos humanos;
III -
autodeterminação dos povos;
IV -
não-intervenção;
V - igualdade
entre os Estados;
VI - defesa
da paz;
VII - solução
pacífica dos conflitos;
VIII -
repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX -
cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
X - concessão
de asilo político.
Parágrafo
único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica,
política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de
uma comunidade latino-americana de nações.
O legislador constituinte se inspirou na Carta da ONU, assinada em
1945, ao escrever o art. 4º da CF/88. Naquela Carta, expressou-se o maior
sentimento da humanidade após o início da II Guerra Mundial: busca da paz.
Em nossa Constituição, tal sentimento foi registrado nos incisos
III, IV, VI, VII e IX. Observe que nela determina-se que a RFB buscará a
autodeterminação dos povos, ou seja, respeitar a sua soberania, não intervindo
em suas decisões.
Isso porque defende a paz e, para tal, a solução pacífica dos conflitos,
assumindo que as relações entre os povos, o dever cooperação. Uma das
consequências da II Guerra Mundial foi a independência das colônias.
Percebeu-se que, para haver paz, é necessário independência
nacional, ou seja, ter sua soberania respeitada pelas outras nações. Além
disso, verificou-se que a paz somente é possível com a igualdade entre os
Estados, pois a existência de colônias e as sanções impostas à Alemanha após a
Primeira Guerra Mundial foram as principais causas para a eclosão da Segunda.
A igualdade entre os Estados é uma contrapartida à independência
nacional: é o compromisso de que uns respeitem a soberania dos outros. Esses
são os motivos pelos quais os incisos I e V do art. 4º foram escolhidos por
nosso constituinte como princípios das relações internacionais do Brasil.
Finalmente, qual a imagem mais forte da II Guerra Mundial? O
massacre dos judeus, nos campos de concentração, promovido pelos nazistas. Uma
vergonha para a Humanidade. A Carta da ONU, em consequência, assume como
princípio o estímulo aos direitos humanos. Inspirado naquela Carta, nosso
constituinte elevou à condição de princípios a serem buscados pela RFB em suas
relações internacionais a prevalência dos direitos humanos e o repúdio ao terrorismo
e ao racismo.
O parágrafo único do art. 4º da Constituição traz um objetivo a
ser buscado pelo Brasil em suas relações internacionais: a integração
econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação
de uma comunidade latino-americana de nações.
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